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Postado 3 de maio de 2023

O advogado do diabo e a lei do cão

Há os pets necessários – cães-guia e cães de assistência. Os demais são lulus em trânsito no lugar e na hora errados. Se eles pudessem falar, concordariam.

Parece bonitinho, parece fofinho, mas é lei ordinária. No pior sentido. A partir de 29 de maio (é bom marcar no calendário) passa a vigorar, no Paraná, legislação que autoriza o transporte de animais domésticos em ônibus intermunicipais.

Norte a Sul

Se são intermunicipais pode-se inferir que a permissão abranja também o transporte urbano da Rede Integrada, o que significa toda a região metropolitana de Curitiba e todas as macrorregiões do estado.

Novilíngua

Pets, ora em diante, que não ultrapassem 12 quilos, o peso pode ser dividido em até dois animais – um cachorro e uma cobra, por exemplo, desde que aquele não seja feroz e esta não seja peçonhenta – viajarão, assim, ao lado de seu sorridente dono (ops, tutor na novilíngua), desde que acondicionados em contêineres ou caixas especiais.

Revolução dos bichos

Inclua na lista galinhas, patos, porcos e aranhas peludas porque, ora, são animais de estimação. Ao menos na perspectiva do dono (ops, tutor).

Onda gigante

Essa não é uma discussão recente. Desde que os bichos ganharam a denominação de não humanos, que se adequa aos novos tempos (pobre é um “não rico”?), há uma onda tsunâmica buscando ampliar o direito do pet em nossa urbanidade.

Eu, bicho

O cachorro, por exemplo, não é apenas aquele que late no quintal. Ele é mais. Trata-se de um bicho sujeito de direitos com capacidade postulatória perante o juízo.

Translation

Se não pode pleitear seus direitos em palavras – ainda não se inventou um tradutor de latidos, miados, guinchos e sibilados –, eis o dono (ops, o tutor), ora em diante denominado representante legal, pronto para a missão.

Sempre cabe mais um?

Em São Paulo, ícone da vida urbana, há leis em profusão que zelam pelo direito animal. Inclusive aqueles que condicionam o trânsito de animais no lotação de todo dia, uma vez paga a passagem, porque não existe ração grátis. A imagem das latas de sardinhas sobre rodas enfrentando o congestionamento diário logo vem à mente. Se a cena parece dramática, acrescente um contêiner latindo ou miando.

Lei getuliana

Toda a discussão do direito animal no Brasil sustenta-se no artigo 2º do decreto 24.645 de 1934, sob Getúlio Vargas, que teria sido recepcionado pela Constituição. Há vozes contrárias. O dito texto legal prevê punição àqueles que apliquem maus tratos a animais em local público ou privado.

Tô apertado

Pois bem. Se viajar em ônibus apertado, enfiado em uma caixa, cercado de humanos, durante período que pode ultrapassar hora, não é indício claro de maus tratos, com a agravante das privações de natureza fisiológica (xixi, cocô, pum), não se pode precisar então o que é sofrimento.

Regra, não exceção

Há os pets necessários – cães-guia e cães de assistência. Os demais são lulus em trânsito no lugar e na hora errados. Se eles pudessem falar, concordariam. Em breve, um tradutor animal. Pois então, eis uma tecnologia esperada.

Post Scriptum

A lei entra em vigor sem regulamentação. Não é apenas um detalhe.

Coluna publicada no Diário Indústria e Comércio em 17 de abril de 2023.

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